sexta-feira, 26 de março de 2010

Pense global, exploda o local


Fazia tempo que ela tinha deixado de estranhar. Pela terceira vez, na mesma tarde, eu entrava na tal livraria. Desta vez, porém, ela preferiu esperar no café anexo.
Fui direto até as prateleiras de sociologia. Procurava por mais um Bauman sobre o qual ouvira falar dias atrás. Prefiro procurar a pedir aos atendentes. Sempre há o risco de se encontrar coisas interessantes durante a mineração.
A primeira coisa que acaba me chamando a atenção é uma garrafa plástica com, supostamente, água mineral sobre a terceira ou quarta prateleira. Na mesma hora desconfio.
Não haveria ali uma câmera miniatura transmitindo ou gravando aquilo que estava pesquisando? Quem estaria fazendo esse tipo de monitoramento na seção de ciências sociais e afins? Será que ela grava e alguém busca os arquivos mais tarde? Onde ficaria a câmera? Na tampinha azul? Estaria oculta pelo rótulo? Minhas leituras me colocarão em risco? E se essa garrafinha virar e molhar os livros? Por que alguém deixa uma garrafa num lugar desses? Pior do que isso. E se for algum tipo de explosivo líquido? Quanta destruição aquela quantidade seria capaz de produzir? Como alguém burlou a segurança e entrou com isso? Morrerei como um mártir anônimo? Agora é isso: o terrorismo fashion dos explosivos líquidos. E se alguém pensar que fui eu quem a colocou ali?
Desisto de ‘Medo líquido’. Saio apressado olhando para os lados. Suspeito pelo caminho de um barbudo e de uma menina com cabelo preso. Deixo a garrafinha e Zygmunt para trás. Volto amanhã. Volto outro dia.
Chego à mesa onde ela me aguardava. A mineral que ela pediu nem chegou ainda.
“Já achou o livro? Como você foi rápido!”
“É, né? Vamos embora?”
“E a minha água?”

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